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À UMA INCÓGNITA

SEBASTIÃO UCHOA LEITE

  • R$ 53,00

Tomados pelo desencanto com o país, custa-nos crer que alguma coisa entre nós tem dado certo. Ela entretanto existe. Refiro-me a determinada tradição de poesia. Sob o signo (necessário) da metamorfose, ela parte de certo Bandeira, engloba o primeiro Drummond, se alarga com a metáfora alucinada de Murilo, se condensa na palavra seca de Cabral e no construtivismo dos concretos. A poesia de Sebastião Uchoa Leite pertence a essa linhagem, a que amplia — se a redução física também pode ser ampliação — e radicaliza. Fiel à sua estirpe, nela não há concessões nem à palavra eleita porque de todos usada, nem à forma de sintaxe que privilegia o mistério. Contra a corrente do esperado pelos propagadores do que-já-nasce- acessível, a poesia do autor privilegia a contensão antes implosiva que resplendente. A sintaxe é reduzida ao mínimo grama do expressivo, não para que facilite senão para que ele se torne extremamente denso. A ironia e a auto ironia (cf. "Cisne) aumentam a distância contra a empatia primária, a que Adorno bem chamara de catarse culinária. Não nos enganemos porém: esse processo de rarefação não é o do afastamento da circunstância contemporânea. Muito ao contrário. Sem endeusá-la ou dar-lhes as costas, é, por ex., a linguagem computacional que, em “digitação", é usada para, irônica e não parodicamente, dizer-se da poética e da morte. A ironia, porque composta sobre frases "tecnológicas", cancela o macabro e varre o ornato do bico de pena. O mesmo ainda se nota quanto aos poemas políticos. Longe do engajamento declamatório, ela é entretanto uma poesia que foca a cena política imediata. Ressalte-se o paradigmático "A alma do negócio". Pois o mundo circunstante, presente pela linguagem das máquinas, pelo show off das autoridades, pela velada alusão a dados biográficos, é tão interlocutor nestes poemas quanto a musica, a pintura e o cinema. Assim se compõe uma poesia de cunho ao mesmo tempo intelectual — em diálogo com mentes e questões — e sensível — imersa na delicia/tontura dos sentidos; combinação não isenta de tensão, como indica a abertura de "outra nietzscheana": “A tensa pantera/ Não salta/ Porque pensa". Estranho o efeito desta poesia da negatividade: ela estimula o cara-a-cara com a vida.

Luiz Costa Lima

Autor(a) Sebastião Uchoa Leite
Nº de páginas 72
ISBN 978-85-7321-280-8
Formato 14x21 cm

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