Seu carrinho está vazio.
Leminski no círculo dos escritores mais inventivos se ombreia em talento com Joyce, Rosa ou Carroll no fabuloso Catatau, seu aclamado primeiro livro, e a um Italo Calvino ou Cortazar neste Agora é que são elas.
Sempre genial no que fazia, Leminski saiu-se com esta: “O romance não é mais possível. Agora é que são elas é um romance sobre a minha impossibilidade de fazer um romance”. E lançou então esta narrativa, em lúdico e atrevido exercício, misturando todo seu repertório e talento como poeta, tradutor, ensaísta, publicitário, músico e transgressor inventivo de diversas normas.
Com grande habilidade e competência neste ”suprarromance” misturando paródias, ironias, citações várias, inversões de perspectivas, norma culta ou linguajar desbocado, Leminski vai tecendo tramas: personagem sem nome, narrador-malandro que queria ser médico, mas virou astrônomo, tem um caso com Norma, filha de seu analista Vladimir Propp, escritor russo, autor da Morfologia do conto maravilhoso...
As normas propostas por Propp nesse livro norteiam ou confundem a vida e ações das personagens enquanto rola uma agitada festa que estranhamente não comemora nada, divagações e questionamentos sobre os lances de uma guerra em algum lugar no cosmos, idas e vindas no tempo e no espaço, na história: tudo parece muito ao acaso, despretensiosamente ou não, para reviravoltas do pensamento culto, da filosofia à psicanálise, com uma linguagem simples, leve e solta, ligeira e musical, embaralhando e desmascarando as articulações da lógica e as regras dos esquemas prontos.
Além das aparências, este definitivamente não é um romance fácil ou superficial. E a crítica vem se desdobrando em análises para lhe renovar elogios.
A vida como um carnaval passando pelo labirinto, dentro ou avessa a certas normas. Ficção e realidade, indagações sobre a existência. “Ao delito de deixar o dito pelo não dito” é o pensamento vivo de Leminski que conspira por aqui. Mas será que é mesmo assim?
Elson Fróes