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Publicado mais de meio século após sua morte, Cartas da Terra é um genuíno libelo mordaz contra os poderes da religião. Twain compõe um relato corajoso ao despir toda a aura sagrada em torno das premissas bíblicas, inquirindo as contradições ou a irracionalidade que a religião propaga como verdades. Era como se tentasse desconstruir os dogmas da fé, acicatando as relações entre Deus e os homens, com uma alta dose de ironia cáustica.
Em Cartas da Terra, Satã escreve onze epístolas a partir da Terra, onde está no exílio e após ter afrontado Deus. São uma mescla de ficção e ensaio, permeadas por um tom sarcástico e crítico que analisa a fé, revelando aspectos ambíguos do homem, que é capaz de matar seu semelhante sem piedade ou remissão e ainda invocar o nome de Deus. De certa maneira, Twain assenta o alvo da sua crítica sobre três pontos: a sexualidade, as doenças e as contradições dos Dez Mandamentos.
A partir de tais premissas, o escritor dirige seu látego crítico sobre questões como o uso da sexualidade na Bíblia e coloca em xeque dados adquiridos, se interrogando, por exemplo, como o criador permite que haja insetos portadores de bactérias suscetíveis de matar sua própria criação, ou seja, homens e mulheres, através de doenças ou epidemias que assolam povos e devassam nações, sem interceder para que tais fatos não ocorram. Além disso, Twain faz uma defesa inflamada da ciência. Portanto, nada mais atual num momento em que o mundo enfrenta uma pandemia colossal, e os interesses religiosos digladiam contra os poderes da ciência e a incredulidade humana.
Jorge Henrique Bastos