Seu carrinho está vazio.
MISS TEMPESTADE
Miss Tempestade não tem tempo
O cinza avança sobre o azul
Hieróglifos elétricos riscam o céu
Escreva, Miss Tempestade
Que esse dia branco é seu
Despenque sobre esse vazio
Preencha o silêncio de Deus
#
Não contemporize a sua intensidade
Pode ser que o poema “Paisagem narcisista” seja o signo deste Cinemaginário, livro de estreia do poeta paranaense Ricardo Corona. Isso, porque o poema é uma expressão dinâmica — tensa e densa — de como a experiência da vida pode estar na linguagem. Não é só a performance da paisagem “narcísica” que impacta nossas consciências: “em mim incide o que está depois da paisagem: / oásis, Iemanjá, sereia, miragem”. Aqui, a criação poética é mais do que a reprodução do “clic”, do “flash”, do “espanto” que se associam a um único ato, precário, de percepção que nos é fornecido, e vai além da estampa — ou parte dela — para revelar o invisível, a alma da paisagem.
O repertório léxico/semântico deste livro é, indubitavelmente, o tema do olhar: como olhar o mundo, como ser olhado pelo mundo, ao mesmo tempo que imaginamos o mundo sendo olhado por nós, e como transmitir verbalmente o processo do olhar. O olho edita imagens (cinema), fragmentando-as, vertendo-as: o poema é a visão do olho-câmara da imaginação.
É importante notar que os poemas foram escritos em Curitiba, onde não existe uma paisagem exuberante, das que costumam inspirar poetas. Talvez por isso a paisagem destes poemas seja menos narcisista, feita de “chips de memória”, inventada, e com o movimento (vortex, vórtice) da voragem do olho da mente (alucinação, miragem). Paisagem sob a luz da lua. Lunar. Paisagem borrada. É no invisível que funciona o olhar do poeta para mediar uma “estranha alquimia” que permeia a força de uma voz poética além de sentimentalismos e naturalismos.
David William Foster
Department of Languages and Literatures
Arizona State University