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Um século transcorreu desde a primeira publicação em livro de O coração das trevas, um século de luzes ofuscantes e trevas infernais, de maravilhas da ciência e da técnica a serviço do homem e também da destruição de multidões; de prodígios nas artes, na política de povos e nações, na aventura humana, mas de espetáculos estarrecedores de loucura coletiva, de destruição em massa, de atrocidades extraordinárias. Na literatura, profundidades insondáveis da condição humana foram exploradas nos limites extremos do conhecimento e da imaginação por nomes glorificados de todos os continentes cuja lista ficaria incompleta sem James Joyce, Thomas Mann, Bertold Brecht, Albert Camus, Machado de Assis, Guimarães Rosa, Jorge Luis Borges, para citar apenas alguns.
Com tudo isso, nos últimos cem anos, poucas obras literárias tiveram o glorioso destino de ser o apanágio de sua época e um repertório de premonições do futuro como ocorreu com O coração das trevas, de Joseph Conrad. Editada e reeditada seguidamente em línguas incontáveis de todos os quadrantes do mundo, a jornada do marinheiro Marley ao mistério de Kurtz e de sua própria consciência e condição humana nas profundezas abissais da selva africana se constituiu numa referência perene da cultura mundial.
Percorrendo os meandros tortuosos da colonização europeia da África do fim do século XIX cujas práticas e motivações vão encontrar seu ponto de confluência e representação nas motivações e práticas do atormentado Kurtz, a jornada de Conrad, inspirada nas observações de sua viagem pessoal à região e nos relatos das atrocidades que ouviu em primeira mão de protagonistas daquela realidade tornou-se o marco de uma literatura engajada nas preocupações sociais de sua época sem se perder em partidarismos transitórios e localizados.
Sobre o romance, André Gide escreveu: "É um livro magistral! Nele não sabemos o que admirar mais: o tema prodigioso, a construção, a audácia de realizar uma empresa tão árdua, o sábio argumento, a compreensão absoluta do tema. Interessa-me profundamente a afinidade que descubro entre este livro e Lord Jim; foi uma pena não ter falado disto com Conrad".
Como toda grande obra literária, O coração das trevas abriu suas portas e janelas generosas para o diálogo fecundo com outros meios de expressão cultural, em especial com o cinema. E diferentemente do que aconteceu com outros textos que ficaram empobrecidos e apequenados na sua transição para a tela, o romance de Conrad encontrou em Apocalypse Now de Francis Ford Coppola, uma grande interpretação.