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Os intensos debates, suscitados ao longo dos últimos cinquenta anos pelas políticas culturais aplicadas pelo Estado desde a criação do Ministério da Cultura por André Malraux no final da década de 1950, merecem maior divulgação por sua intensidade, pertinência e por serem, hoje, quase “clássicos”.
Augustin Girard - Presidente da comissão de história do Ministério da Cultura na França
Desde a criação de seu ministério no final dos anos 1950, com o escritor André Malraux à frente, a França desenvolveu uma experiência pioneira, consistente e persistente de intervenção do Estado no campo da cultura. Essa opção motivou paixões, favoráveis e contrárias. E o “caso francês”, com seus erros e acertos, tornou-se um clássico de conhecimento necessário para a compreensão da dinâmica cultural moderna. Neste volume, artistas, sociólogos, filósofos, administradores e políticos passam em revista a história da política cultural do país que ainda faz da cultura um pilar da vida econômica, social e cotidiana.
Algumas soluções, novos problemas
Na França, a cultura tem sido uma questão de Estado. Para o pior e para o melhor.
De fato, talvez não haja outro país democrático no qual a cultura se associe tão intimamente à identidade da nação e do Estado. Não há nação francesa, nem Estado francês, sem a cultura. Direita e esquerda, no poder, dedicam-se igualmente à ratificação de uma imagem cultural nacional. E, até há pouco, era impensável um político tornar-se presidente da república sem nunca ter escrito um livro.
Esse quadro, no entanto, es¬tá longe de ser idílico. Neste volume, é eloquente a posição de Jean Dubuffet, expoente da arte bruta, denunciando o esquema político que asfixia a cultura real com uma ascendência da burocracia sobre a criação e que conduz a distorções como esta, conhecida no Brasil, segundo a qual a cultura é, antes, uma questão de interpretação (leia-se: educação) e divulgação do que de criação. E Dubuffet vai mais longe: a cultura é a ordem, é a palavra de ordem, isto é, a corrosão e a corrupção da criação. Carl Andre, nome maior da arte minimalista, disse o mesmo em outro lugar: “arte é o que nós fazemos; cultura, o que fazem conosco”. Com o Estado cultural surgiu a política cultural e problemas novos foram criados ao lado dos resolvidos. O ensaísta Alain Finkielkraut aponta para o que considera um dos maiores equívocos da política cultural atual: conceber qualquer estilista da moda como tão relevante quanto Shakespeare; um futebolista, um valor igual a Michelangelo; um cantor de rap, como não inferior a Stravinsky. Para ele, esse relativismo cultural, fruto da política cultural vista como democratizante ou, pelo contrário, demagógica, nada faz além de dissolver a cultura num “tudo é cultura”. Ao lado, outras vozes se levantam para afirmar que, sem o Estado, a cultura não existiria ou viraria mercadoria – commodity.
O tema em entrelinha neste debate é o da cultura como uma questão de política pública coletiva ou da cultura como assunto pessoal do qual o Estado tem de ficar distante. Como o debate deste livro é sobre um Estado cultural, a França, as questões relativas à primeira posição são mais fortes. Mas a cada instante o leitor é convidado a pensar por conta própria sobre os erros e acertos não apenas da França, país modelo nesta área, como de toda política pública para a cultura.
Teixeira Coelho