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Luci Collin é escritora experiente, já circulou por diversas formas de escrita e, neste livro, se vale de muitas delas. Seus “contos” começam como pequenos recados, que em princípio deveriam ser endereçados a pessoas cujos nomes começam com a letra “P”, o que confere ao texto uma certa organização, rompida por um recado endereçado a Cilinha. Essa quebra de expectativa, que lhe dá um tom humorado, o leitor encontrará em todo o livro. Luci diz fugir das listas, ainda que uma delas apareça em forma de inventário nas páginas seguinte. Não se pode levar a sério as propostas da autora: num conto sobre literatura feminina, ela resolve discorrer sobre qual o melhor sabão para limpar manchas. Neste livro, Luci brinca com a linguagem, deforma clichês, faz juras de amor absurdas, define terminologias musicais com pequenas prosas poéticas. Num de seus contos, faz uso de um discurso digressivo à moda de Malefícios do tabaco, de Tchékhov; um outro é feito só de começos, à moda de Macedonio Fernández, mais uma brincadeira da autora que alerta: “guarde que o que faço é cópia”, ou, diria, pastiche do mais alto nível.
Dirce Waltrick do Amarante
Quem é você, Luci Collin?
Que domínio é esse que você tem sobre as palavras? Que palavras são essas que você usa? De onde as tira, de que mistério você as traz para nos preparar armadilhas?
O que você quer de nós ao nos propor esses universos feitos de palavras enlouquecidas, vindas à luz de que maneira, hein, me conta?
Ler você é o quê? Um alumbramento?
É também participar de uma travessura porque sempre lá está seu olho piscando, como se dissesse: Veja o que fiz. Não é hilariante?
Você não respeita nada, respeita?
Nos leva pela coleirinha a mundos surreais, e ainda dá-se ao luxo de ser engraçada.
Dá-se ao luxo de ser irônica, sarcástica, desconcertante. De nos desassossegar.
Você foi prima de Ionesco, tia do Jarry, contraparente do Joyce?
Toma tento, menina, você anda se divertindo demais. Sua única justificativa, reconheço, é que também anda nos divertindo muito, obrigada.
Meu palpite é que você ousou entrar na casa da literatura pela porta mais legítima, a da liberdade, e pôs a imaginação e a poesia dançando com as palavras. Um caminho que poderia ser bem solitário, não fosse a graça com que você as coloca para dançar, não fosse sua capacidade de nos puxar e nos arrastar para dentro de seus ritmos, suas palavras pulsantes, sua harmonia feita de notas que são só suas (se é que posso dizer isso, posso?)
Que mistérios tem você, Luci Collin?
Seu livro deveria ser indicado para todos aqueles que adoram cercear a inventividade, impor limites, criar cercas. E também indicado para todos aqueles que, ao contrário, adoram acompanhar as impossíveis belezas criadas pela imaginação de um poeta, suas zonas sem fronteira e sem dono.
Decifrei-te, Luci Collin.
Mesmo quando é contista e romancista, você é sobretudo poeta.
Maga da invenção e da palavra.
E cabe agora a você, leitor/leitora, também entrar na dança que ela criou.
Entrar de mente e coração abertos neste pequeno reino inovador e livre.
Encontrar suas pérolas.
Maria José Silveira