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Este é um livro sobre a solidão. Os personagens parecem os que Edward Hopper imobilizou em suas telas, ensimesmados, com o olhar perdido em ambientes vazios. Em seis histórias cerzidas umas às outras com delicadeza, Rita Buzzar retrata os desencontros que permeiam as relações humanas e nossa perplexidade diante deles.
"Tenho a impressão de que sempre vivi aqui. Todos são estranhos. É como num filme de suspense", diz Sofia, a trágica protagonista do conto "Lembranças e esperanças", carregado de tensão desde o primeiro momento, quando André atende o inspetor de polícia para ouvir que seu número de telefone fora encontrado num papel amassado numa das mãos da amante morta e vestida com homem, num quarto de hotel. A partir desse início intrigante, o enredo se desenrola, até o insólito desfecho, num turbilhão cinematográfico.
"Em destinos tão distintos", o encontro de Samuel, maestro reverenciado, com o amigo que toca violino para os transeuntes é uma fábula de como o tempo pode afastar duas pessoas, a ponto de impedir-lhes a comunicação.
Marian, em "Marian e Pedro, 1948", percebe que já se haviam passado 45 anos de sua paixão pelo vendedor de enceradeiras e da noite em que ele vendeu a coleção de discos de tango para levá-la para jantar.
A faxineira muda encarregada de limpar as salas do aeroporto, onde estranhos personagens se movimentam, é a figura central de "Luzia".
"Olhos na neblina" é um conto com toque machadiano. "Contas pagas, filhos na escola e um homem na cama"... "O que mais posso pedir?"— acrescenta perplexa a oftalmologista que encontra ocasionalmente, num avião, um amor do passado que lhe traz reminiscências da juventude, no bairro da Mooca, e a consciência da vida pacata ao lado do marido.
Por último, "Boletim de Ocorrência", mostra uma mulher assustada com a possibilidade de ter um tumor maligno, ao defrontar- se com um homem armado que ameaça acabar com sua vida em um segundo. Nessa relação metafórica entre vida e morte ela é conduzida ao universo marginal de seu sequestrador.
Neste livro encontramos uma escritora em plena forma, atenta ao significado das palavras, empregadas com a finalidade de invadir a alma de seus personagens e explorar o lado nebuloso da existência humana.
Drauzio Varella