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O leitor que, diante deste livro de Luciana Salum, parar para ler e escutar aquilo que a autora escreve de sua psicanálise correrá o grande risco de ser atravessado pelo espanto e perplexidade. Mais do que uma obra sobre as articulações entre clínica psicanalítica e crítica literária, tendo as noções de sujeito, escritura e autoria como elementos articuladores, Luciana constrói um experimento marcado por extrema liberdade, invenção e coragem. Parafraseando a máxima de Michel de Montaigne, ela não pinta o ser, pinta a passagem: passagem entre psicanálise e literatura, vida e obra, escrita e escritura, experiência e transmissão, eu e outro – que a autora, referindo-se a si própria, funde no neologismo “eutra”. Por isso, seu movimento com as palavras é como uma dança, espécie de pas de deux em que seu par se faz presente, entre passos e passagens, pela ausência que evoca, pela ausência que performa. Em um mundo saturado de “eus” hipertrofiados, o texto de Luciana, por meio da poética do fragmento, vem fazer companhia àquela radical afirmação beckettiana de que “eu nos faltará sempre”. Pois só quem comparece ao próprio desencontro pode escrever, com graça e leveza, de sua psicanálise.
Ilana Feldman