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Ponge aplica, sem saber, o axioma que está na origem de toda Fenomenologia: "Ir às coisas mesmas".
Jean-Paul Sartre
A árvore de Francis Ponge é uma árvore que observou Francis Ponge e se descreve como imagina que ele poderia descrevê-la.
Maurice Blanchot
O trabalho inteiro de Francis Ponge é uma tentativa de fundação da linguagem.
Phillippe Sollers
Na biblioteca poética francesa do século XX, Francis Ponge, diz-se frequentemente, é o poeta dos objetos (o engradado, a vela, a ostra...).
É bem verdade que seu livro mais conhecido (e sua obra de certo modo inaugural) intitula-se Le parti pris des choses (1942). Mas os objetos não são as coisas. Se os textos de Francis Ponge vêm postar-se diante da objetividade das coisas, é menos para fazer advir à linguagem a materialidade plácida e a mudez dos objetos do mundo do que para enfrentar e tratar aquilo que a alteridade objetiva opõe aos poderes da representação (e, mais geralmente, à possibilidade do simbólico).
Francis Ponge é o poeta daquilo que as coisas recalcitrantes (quer dizer o mundo, a natureza: a natura rerum de seu modelo, Lucrécio) objetam à linguagem dos homens. Ponge e o poeta da distância das coisas e de seu engendramento poético na linguagem mesma que sua distância força à estranheza. Ponge é, em suma, o poeta cruel e jubiloso do real enquanto este último, como sugeria Lacan, é o que "começa lá onde o sentido para".
Daí a língua relativamente lisa, estável e pacífica e as formas do Parti pris des choses se rasgarem mais tarde, serialmente ritmadas e precipitadas nos múltiplos estados de um rascunho infinito e inquieto ao tempo da Rage de l'expression (1952), do Soleil race en abyme (1954), da Fabrique du pré (1971) ou de Comment une figue de paroles et pourquoi (1977). Pois os objetos que mobilizam a emoção (o afluxo do mundo sensível) e a tentação do esforço de estilo (a rage de l'expression), é preciso antes de tudo, diz Ponge, na ficção teórica do Objeu (Objeto-em-jogo), polos "em abismo" — isto é, reconhecer sua radical separação e a inadequação da língua à sua objetividade insensata. É aí que surge a poesia, ressoando no infinito dessa inadequação tratada como merece, vale dizer, com a beleza obscura, ritmada, estrangeira e imperiosamente formalizada da recriação de um outro mundo, posto em face do "mundo mudo"...
Toda uma visão (violenta, razoável, apaixonada) do mundo, da língua, de sua eterna altercação funda-se aí. É uma lição para toda poética, um osso duro de roer para toda tentativa de leitura crítica, um ponto de passagem obrigatório para quem quer que se preocupe com o que seja a... literatura.
Christian Prigent