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UM LIVRO MUITO FAMÍLIA
Quando o médico psiquiatra, pensador liberal e intelectual Heinrich Hoffmann (1809-1894) quis providenciar um livro como presente do Natal de 1844 para o filho mais velho Carl, de três anos, teve muitas dificuldades – como contou no texto reproduzido em posfácio desta edição. E quando então resolveu ele mesmo escrever e ilustrar um, nem com toda imaginação previu que Der Struwwelpeter se tornaria um dos maiores best sellers da literatura infantil de todos os tempos.
Publicado por insistência dos amigos no ano seguinte, com uma edição de 1.500 exemplares, Der Struwwelpeter iniciou uma brilhante carreira editorial em seu país natal, a Alemanha: em 1876 estava na 100ª edição, em 1898 na 200ª, para chegar a mais de quinhentas só em alemão; ganhou muitas paródias e adaptações (sobretudo de cunho político); e traduções em cerca de 40 línguas, inclusive para o português brasileiro, com traduções dos séculos XIX (relatada por Hoffmann no mencionado texto de 1871) e XX. Seu nome mais famoso em português é João Felpudo, e aqui está ele de volta, no século XXI.
Em 2009 foram comemorados os duzentos anos de Heinrich Hoffmann, esse médico que contava histórias para distrair seus pequenos pacientes, as reproduziu em livro doméstico e hoje é lembrado como um dos maiores escritores da literatura infantil. O sucesso é tamanho que Der Struwwelpeter tem até museu em Frankfurt.
Aqui no Brasil, perguntem a uma pessoa mais velha se não conhece Der Struwwelpeter ou João Felpudo. Certamente ouvirá relatos de pais, avós ou tios contando as histórias desse livro que tem imenso talento para romper fronteiras. Serão pessoas com ascendência europeia, que não raro recitam de cor muitos versos do livro, aproveitando para reproduzir, com um misto de nostalgia e despreparo, a língua dos antepassados; mas também serão pessoas que se lembram de João Felpudo nas versões de Olavo Bilac ou Guilherme de Almeida, para citar os mais famosos tradutores brasileiros.
O fato é que já no século XIX Der Struwwelpeter deixava de ser um livro germânico para ser europeu. Não demorou em tornar-se universal.
Além das virtudes literárias do livro, as ilustrações de Hoffmann suscitam algo no mínimo estranho: por não serem as de um profissional, dão a impressão de que nós mesmos poderíamos tê-las feito, e mais: experimentem ler as histórias uma ou duas vezes. Na terceira este ou aquele personagem já caberá em alguém muito próximo. Nas seguintes (pois asseguro que vão querer lê-las sempre), encontrarão traços do traquinas Felipe no primo-irmão; do malvado Frederico em si mesmos; ou dos moleques que zombam do “mourinho de tez retinta” em alguém que, providencialmente, vocês não conseguem lembrar quem é...