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"... Macedo é um escritor alegre e satisfeito, porventura o único da nossa literatura. A sua arte lhe é um divertimento, e o seu objeto, praticando-a, divertir os seus contemporâneos, sem talvez se lhe dar dos vindouros. Diverti-los moralizando-os, risonhamente, despreocupadamente, sem outro propósito mais alto, tal parece ter sido o seu intuito literário"

José Veríssimo, História da literatura brasileira.

"Macedo foi o herdeiro do espírito cômico de Pena e prosseguiu na senda por ele aberta.

Eu o vi, muitas vezes, atravessar as ruas concorridas do Rio e encaminhar-se para a estação de barcas de Niterói, onde morava nos últimos anos, através de um desrespeitoso desdém com que se costuma pagar no Brasil aos obreiros, espirituais.

E, entretanto, esse homem popularíssimo entre os anos de 1844 e 68 ou pouco após, tinha sido o mais operoso, o mais fecundo dos nossos escritores, um dos fundadores, senão o verdadeiro fundador do romance no Brasil, um dos criadores do nosso teatro, um dos mestres de nossa poesia".

Sílvio Romero, História da literatura brasileira.

Quem um dia não se imaginou possuidor de um dom ou instrumento maravilhoso, que permitisse ler pensamentos e olhar corações, penetrar no âmago da verdadeira índole dos outros, e espiar daí o que eles não revelam mas sentem e praticam? E se, por um acaso, o caro leitor se deparasse frente a um tal prodígio? Furtar-se-ia ao fascínio de utilizá-lo, mesmo advertido das possíveis complicações que isso poderia lhe trazer? Pois é este o dilema que enfrentará o protagonista deste saboroso romance de Joaquim Manuel de Macedo.

Atormentado por uma anomalia de nascença, que não apenas lhe turva a visão mas o entendimento, o anti-herói desta história se presta a nos guiar — como um Virgílio zarolho  —pela trilha sinuosa de uma sociedade que, mais do que caminhar, parece cambalear para o futuro. Estamos no Rio de Janeiro do Segundo Reinado. Até aí transportado, o leitor verá, com a ajuda desta mágica luneta, o desenrolar da tragicômica situação que marca o aprendizado do protagonista. Um aprendizado que se consuma através de uma série de hilários acontecimentos, que não apenas dirão respeito à figura solitária da personagem mas tocarão a natureza de um conglomerado humano mais vasto: uma ainda desfigurada classe média em busca da sua estabilização.

 Através de uma prosa amena, Joaquim Manuel de Macedo, o célebre autor de A Moreninha, constrói nesta Luneta Mágica um enredo empolgante, que substitui o excesso de pieguice característico da primeira pelo mistério que prende a leitura, mantendo daquela o mesmo gosto pela descrição de costumes e cenários, que hoje nos devolve a um dos momentos originários da nossa formação urbana.

Mistério e história, talvez sejam esses os dois elementos a construir a grande metáfora deste romance, que mais do que mostrar as trapalhadas da vida desorientada de um indivíduo, deixa-nos perante as confusões e embaraços de uma nação que reluta em ser sensata. Afinal, como o próprio leitor verá, conflito individual e conflito coletivo parecem optar por destinos diferentes.

Só resta lamentar que o nosso Macedo não tenha possuído, como sua personagem, potente luneta para prever o sucesso que, mais de cem anos depois, teriam entre o público as continuações, e nos ofertar com uma segunda parte da sua história. Ou, quem sabe tivesse o autor um tal conhecimento do seu meio, que pode pressentir o pouco atrativo de uma História que não se modifica, poupando nesse caso o leitor de tão ingrata continuação.