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O enxame de crianças
Soterra o carro no semáforo
De baixo para cima:
o pé chato
o inchaço da fome
a costela em espinhaço;
De cima para baixo:
os olhos...
os óleos de Segall.
Poetas são catalisadores da procura. Senão, por que nos interessaríamos pelas aventuras e desventuras amorosas de Camões, de Petrarca ou de Drummond? Aquilo é pessoal, percepção sensível da realidade, desvela-se nos versos e nos atinge, como se vivenciássemos as mesmas emoções. Alguém afirmou que quanto mais fundo o escritor mergulha em si, mais universal se torna. Por isso faz sentido a poesia. O leitor se aproxima da sua própria intimidade se apropriando da emoção do poeta. Entre os dois — poeta e leitor — a palavra.
O poema é um ato de amor à palavra. O poeta concretiza em texto sua oferta e, depois, o leitor, cúmplice, se entrega, na identificação com o sentir do poeta. E a palavra, que concretiza essa cumplicidade, revela a percepção de mundo e seus reflexos no interno de cada um. Ambos, então, se identificam — quer dizer, reconhecem suas identidades, a partir da procura do poeta, que é a procura da própria humanidade.
Maurício Segall é um poeta. Seja na intimidade do relacionamento amoroso, seja na indignação com as injustiças sociais, o poeta Maurício Segall nos oferta a possibilidade de dividirmos com ele emoções fortes. Temos neste livro o prazer de conviver com a existência de um homem que encarou a vida com intensidade e compromissos sólidos, sempre avesso à mesmice, sempre inconformado com o que é injusto ou estático. Sua poesia traduz essa existência dinâmica. Quem conhece Maurício Segall pessoalmente sabe que é impossível ficar alheio à sua presença crítica e inquieta. Assim é sua poesia. São reflexões maduras de quem jamais aceitou comodismos — uma lição de amor à vida.
O leitor, com certeza, irá identificar-se com as procuras de Maurício Segall, qualquer que seja o conteúdo dos poemas, que vai do amor erótico ao sentido da arte, da problemática social à família. E também com certeza irá nutrir-se das inquietações que fizeram a vida desse homem ser tão profícua.
Gilson Rampazzo
Maurício Segall é museólogo e autor de duas peças de teatro premiadas, A Formatura e O Coronel dos Coronéis, editadas pelo Serviço Nacional de Teatro e pela Editora Civilização Brasileira em 1967 e 1979, respectivamente. E ainda autor de diversos artigos sobre política, politica cultural, museologia e outros.