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Você vai pela outro desconto calçada. Tem uma placa de funilaria, resquício de alfazema no mofo da botica. O relógio faliu e você segue, perdido em meadas de pó, você divaga entre lojas e catedrais delicadas. Ao longo da quadra, leviatãs e loterias, convulsão de penas no chão das avícolas. Você vai por questionários, correrias — eterno desvario de gazela azul. No fim da rua há um fliperama, penúltimo ingresso, há o anúncio de um carreto. Na próxima curva, é a Rua Felicidade.
O emaranhado das ruas, cada dia mais denso, propagando seus ruídos. O gesto mecânico. A lentidão das pontes, cobertas pelos lotações de longo percurso, o vaivém da fuligem. Pelas calçadas, a indumentária padronizada, rente aos espelhos da nova arquitetura. A jornada de trabalho esticada e seus "pombos" desempregados. A violência dos fins-de-semana, seus desertos de silêncio. E o poeta ao gelo de avenidas, sem recibo de livrarias.
Mais do que antiacadêmica, a poesia deste livro recusa morada definitiva. A “Rua Felicidade”, procurada claramente ou de forma velada nestes poemas em prosa, nada é senão o próprio deslocamento, contínuo e perpétuo, no interior de uma cidade que não cessa de crescer. Sendo assim, a pauliceia retratada em Meio – fio só pode constituir-se em movimento eterno, refletido no cotidiano dos heróis que por ela transitam (motoboys, taxistas, artesãos nômades, skatistas). Como o beijo da hidra que ondula em seus outdoors, tudo nela muda, tudo quer passar, tudo voa.
Assim os amores que a povoam, anônimos na maioria, ecos bastante audíveis do soneto de Baudelaire ( “À Une Passante”), cuja personagem tem em “Paixão em Trânsito” sua versão masculina. Cenas e paixões cuja transitoriedade parece obedecer á necessidade das Moiras.
Necessidade que, por sua vez, é a mesma com que o poeta andarilho, integrante desse cenário, transforma guarda-chuvas em orquídeas, amigo que é de tudo que pelo exercício de seu ofício possa se transformar em diferença, não raro em próprio oposto. Como a Senhora Loth, que contrariando o texto bíblico segue em frente, como todas as demais. Na poesia isso é possível.