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“Os defeitos de um escritor de reconhecida excelência são mais perigosos porque a influência de seu exemplo é mais ampla, e o interesse da erudição exige que sejam descobertos e apontados antes que lhes seja conferida a sanção da antiguidade e se tornem precedentes de autoridade inquestionável.”
Samuel Johnson
The Rambler nº 93
O Prefácio a Shakespeare foi publicado em outubro de 1765, na edição das Obras do dramaturgo inglês feita por Johnson. Tido como um dos maiores ensaios da crítica inglesa de todos os tempos, o Prefácio constitui uma peça de notável consistência e de grande beleza, e seus juízos, ainda que nos dois séculos seguintes tenham provocado objeções por parte de críticos e literatos, não podem deixar de suscitar o respeito de quantos se debruçaram sobre a obra de Shakespeare. Poucos podem se gabar da liberdade com que Johnson distribuí os méritos e defeitos do bardo. Muitas vezes atacado no século XIX como desprovido de imaginação, Johnson sempre manteve uma estatura intelectual que o coloca acima de muitos críticos renomados — um homem de quem é difícil, ou, como disse T. S. Eliot, “perigoso” discordar. Não, como se poderia pensar, em virtude de um tom prescritivo, mas em virtude de sua argumentação fortemente ancorada na negação de todos os particularismos. O sentido dessa recusa todo aquele que ler o Prefácio poderá facilmente identificar nas passagens em que ele ataca os arbítrios da crítica de seu tempo.
A tradução foi feita com base na edição Yale das obras completas de Samuel Johnson — vol. VII —, de Arthur Sherbo (1968). Os ensaios sobre Shakespeare têm, desde o século XVIII, concentrado boa parte das diferentes visões, conceitos e princípios da crítica literária. Julguei conveniente para o leitor brasileiro anexar uma tradução de Racine et Shakespeare, de Stendhal. Dentre tantos outros escritos de diferentes autores cabíveis no presente caso, a escolha deste texto foi ditada não apenas por sua raridade ou relativo esquecimento, mas sobretudo pelo muito que deve ao Prefácio.
ENID ABREU DOBRÁNSZKY
Enid Abreu Dobránszky, estudiosa de estética do século XVIII, é autora de No tear de Palas. Imaginação e gênio no século XVIII – Uma introdução (Papirus/Editora da Unicamp, 1992) e tradutora. Entre suas traduções publicadas estão Uma investigação filosófica sobre a origem de nossas ideias do sublime e do belo, de Edmund Burke, Ensaios sobre a pintura, de Diderot (ambos pela Papirus/Editora da Unicamp), e A cultura no plural de Michel de Certeau (Papirus), entre outras.