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E o seu pensamento, embriagado por esta felicidade selvagem, se desprendeu dali, desceu as escadas estreitas e tortuosas amarelecidas pela luz, atravessou a rua, caminhou até a grade onde estavam abraçadas as três bicicletas enferrujadas, tirou o cadeado da corrente que prendia a sua, levou a bicicleta pelo guidão por alguns metros e subiu nela da maneira clássica que Líli tentara lhe ensinar, primeiro o pé esquerdo no pedal, o corpo ereto, depois montando em movimento, a coisa mais natural do mundo, e seguiu pelas ciclovias assobiando em surdina e pensando (um pensamento do pensamento), no silêncio desta sua ronda noturna cortada pelo longo assovio da bicicleta de moças, na lembrança que daria ao filho...
O longo corredor do Rijksmuseum de Amsterdam leva direto à parede onde está a Ronda Noturna de Rembrandt. A luz do centro do quadro magnetiza tudo o que existe ao redor. O resto é escuridão. Alguém disse que a vida é como uma ponte de luz que liga dois abismos mergulhados na noite. Estes cinco contos de Ronda Noturna, o primeiro livro de Cadão Volpato, não procuram o sentido da vida. São pequenos afrescos bem-humorados de circunstâncias e seres cujo destino resume-se apenas àquela breve luz na escuridão.
Em Lotte (1959-1962), uma garota lê a revista Senhor atrás da luz do conhecimento, espionada por uma espécie de Werther sem causa.
A Sagrada Família é um Imenso Dente Podre era como Dalí definia a catedral de Barcelona. Também é a história de um pai e um filho que passeiam pelas Ramblas e evocam a mãe.
Em Constelação, ladrões de primeira viagem executam o crime perfeito. Que mistério haveria então no crime perfeito?
O Professor da Noite recebe aulas sobre os mistérios da carne e de Platão.
E, por último, no conto que dá título ao livro, maquinações do Universo infernizam a vida de um pobre-diabo, que percorre, de bicicleta, a mesma Amsterdam guardada pela ronda noturna das sentinelas de Rembrandt Harmenz van Rijn.
São contos entrelaçados por um mesmo motivo: o mistério da alma humana. Mistério insolúvel, mesmo quando banhado pela luz do conhecimento. Mistério perene.
Mas não há dúvidas metafisicas dilacerando as páginas de Ronda Noturna. Pequenas fatias da vida apenas estão ali expostas no seu desconserto, na sua imponderabilidade, na sua graça totalmente humana. Para ler sem susto.
Cadão (Carlos Adão) Volpato nasceu em São Paulo, a 28 de dezembro de 1956. Jornalista, foi revisor, professor de português, crítico de cinema e músico. Apresentou o programa Metrópolis, da TV Cultura, e hoje edita a Revista SET, de cinema e vídeo.