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Os contos de Laís de Castro desenham-se rapidamente – personagem, tempo e lugar. Em sucessão inesperada, com pinceladas curtas, levam-nos ao solar, ao bordel, ao carnaval, a lençóis imaculados (e maculados) ou ao campo rude. Os personagens falam com as marcas da existência: sinhazinha, esposa ressequida, matador, marido cruel, avó criadeira e uma apaixonada que arde em fogo sagrado. Frequentemente, a voz é de um narrador, que pode ser cúmplice, reconhecer, cá entre nós, certas singularidades das situações que narra. Ou pode desfrutar do privilégio de já conhecer o final e brincar com nossa impaciência (“Conversa vai, conversa vem, e quem queria conversar? Pra que ficar insistindo num assunto que todos sabem que vai acabar na cama, pronto, acabou”, resume o narrador de “Abadá”).
É a alma dos personagens que atrai Laís, com seus exageros, esquisitices e, sobretudo, sentimentos. Os protagonistas destes contos desejam, amam, deliram, ofendem-se mortalmente. Com certa insistência, calam. O silêncio – como expressão do vazio ou como instrumento de vingança – aparece como tema. Também o tempo é um assunto recorrente, que ela usa como medida dos sentimentos – ou da falta deles.
Pouco a pouco, pelo acumulo de camadas tão finas quanto as dos bons mil-folhas, ouve-se a voz da autora. Com as rédeas da história bem seguras, ela brinca com as palavras e suas sonoridades, flerta com a música, trafega pelo arrebatamento sem escorregar para a grandiloquência e chega em alguns momentos à fronteira da poesia. Como diz o pedreiro de “Prumo, azulejo e conduíte”, “no mundo tem as pessoas que fabricam, as pessoas que escrevem e as que plantam e criam”. Não sabemos o que Laís de Castro fabrica nem o que anda plantando, mas já está claro que ela pertence à categoria pequena e nobre dos bons escritores.
Marta Goes