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Deonisio da Silva, escritor, professor, crítico, tem uma frase curiosa à respeito de autores que têm o que dizer, e sabem dizer, e dominam a linguagem, a técnica, a narrativa: "São pessoas que têm café no bule", define ele. Vivemos um tempo em que os bules andam meio vazios, porém, no meio do deserto em que anda a literatura brasileira, de onde vem o chocante, o murro no estômago, a pancada certeira? De um escritor que não é "jovem” na idade e tem vários livros publicados: Raimundo Carrero, 48 anos, nascido em Salgueiro, sertão de Pernambuco.
Prepare-se! Você não vai sair impune deste Somos Pedras Que Se Consomem. Carrero atormenta, esgota, suga, leva a escrita ao paroxismo. Um romance como este só pode ser escrito por quem tem muita técnica, conhece o ofício, tem no bule um café espesso, expresso, forte, cujo sabor fica, cuja quentura queima a língua. Um livro intenso, cheio de cheiros, de frutas e de corpos, de esperma e dos rios que cortam o Recife, do lixo e do suor, dos perfumes e hálitos. Um romance audacioso na forma, com poemas, noticias de jornal, diários, fluxo de consciência e inconsciência, citações de dezenas de autores que fazem nossas cabeças, de D. H. Lawrence a Sylvia Plath, Yourcenar a Fitzgerald, Kundera a Clarice Lispector, T. S. Eliot, Pasternak. Uma centrífuga desesperada e agoniante junta tudo isto, mundo desenvolvido com o lumpen do terceiro mundo.
Incestos, traições, sadismo, masoquismo, sexo, sexo, sexo, coxas molhadas, pênis artificiais, lesbianismo, homossexualismo, hetero, masturbações. Amor, solidão, ternura, poesia. Carrero me lembra Henry Miller, com muito mais violência. Ele não poupa os personagens, assim como não poupa o leitor. E no entanto, ficamos fascinados, não há como largar o livro, com porradas de todos os lados, mas com muita emoção. E literatura é fundamentalmente emoção. Carrero é cheio de humanidade para com sua gente, com sua Recife, porque é nesta cidade que tudo se passa, com "gritos de homens vendendo cajus — este texto é dele — abacates, mangas, laranjas, goiabas, os gritos dos vendedores se misturando com os ruídos dos veículos, pneus cantando, moças cantando, sons de rock e lambada, de sambas e boleros". Enfim, um romance forte e brasileiro, cheio de dor nos músculos, carnes rasgadas, vísceras nesta anêmica literatura dos anos 90. E muito Brasil, pé no chão, gente que conhecemos, personagens desagradáveis de nossa história, como aquele presidente expulso pelos caras pintadas, e a morte das ideologias, e o desencontro das pessoas. Que este Brasil, este mundo, esta época de agora é toda de desencontro, ansiedade, inquietação e desejo nos comendo, e os desejos reprimidos pelas pestes, pelas AIDS.
Está avisado. Se não quiser, não entre. Entrando, não há de se arrepender, vai se excitar, ter orgasmos, se deliciar com a alucinada loucura de um autor dos melhores neste momento.
Ignácio de Loyola Brandão
Raimundo Carrero nasceu em Salgueiro, Pernambuco. Publicou A História de Bernarda Soledade - A Tigre do Sertão, As Sementes do Sol - O Semeador, A Dupla Face do Baralho (traduzido para o inglês), O Senhor dos Sonhos, Sombra Severa, Viagem no Ventre da Baleia, Maçã Agreste, Os Extremos do Arco-íris e Sinfonia Para Vagabundos.
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